30 setembro 2007

saíste-me cá uma peça!


I Acto
Recebi num e-mail de quem não vejo há anos: "É um monólogo muito bem escrito, muito forte e representado por uma actriz magnífica."

II Acto
Enviei 3 mensagens. 3 respostas: "alinho".

III Acto
Noite. Sozinha dentro do carro, à espera que a bilheteira abrisse.
Desliguei o rádio e fiquei a ouvir a chuva que eu tanto quis.

IV Acto
STABAT MATER, de Antonio Tarantino, com encenação de Jorge Silva Melo, pelos Artistas Unidos. A actriz: Maria João Luís.

três frases, eram qualquer coisa assim:

Inteligência não serve para os pobres.
O meu filho, o meu filho que é uma grande cabeça, quando acordou já o mundo tinha acordado. E todos os que chegam a este mundo, chegam sempre depois de ele já ter acordado.


É uma mulher derrotada. Feroz. Derrotada. Vencedora. Derrotada.
E ri-me alto. E sorri sem som. E comovi-me. E arrepiei-me. E zanguei-me. E entristeci-me. E sofri mesmo.
E bati palmas em pé e com força!
É que a personagem e a actriz estão mesmo ali e querem também saber e sentir, é isso que é bom no teatro.
Tinha saudades.

(o título é só uma frase que eu gosto. diz-se cá por casa.)

29 setembro 2007

Silêncio














"Naquela época eu tinha medo do silêncio e não percebia que não havia mal nenhum em ficar em silêncio a meio de uma conversa, ou mesmo em não haver conversa entre duas pessoas que vão lado a lado. O silêncio é como o mar. Envolve-nos, e pode submergir-nos, se não soubermos lidar com ele, mas pode também embalar-nos, se perdermos o medo e nos deixarmos ir. Em ambos, mar e silêncio, nada pior do que esbracejar de pânico."

A Espera de Rui Zink

Já tentei dizer muitas vezes que não me incomoda o silêncio.
Que é das coisas melhores que se conquista com alguém, esse embalo confortável.
Estamos com a pessoa, mas também estamos no nosso lugar. E esse lugar faz falta, às vezes. Outras vezes fugimos. Preocupo-me de ver alguém que gosto fugir muito, preocupo-me. Mas sei que é disparate meu, nem todos se acham no mesmo lugar.
E o melhor desse silêncio acontecido é sabermos que o interrompemos assim que quisermos e, ainda assim, não temos pressa.

Esbarrei com o texto na parte de trás do livro, na livraria. Virei e deixei-o estar.
fotografia: Gregory Colbert

27 setembro 2007

Apetece...




Há quem o explique pelo signo: gémeos.
Eu não tenho explicação.
Mas que existem dois lados, existem. Duas formas de sentir.
Uma gémea é quieta e meiga. Confiante de coisas boas. Acho que é esta que procuram para conversar, para andar de gaivota e dizer das coisas lá de dentro. Ficar estendida na relva é um óptimo programa.
Outra gémea é muito inquieta e desapacientada. Quer estar sempre a fazer qualquer coisa que possa trazer novas coisas, de que se possa orgulhar. Acho que é esta que procuram para desafios.
Nenhuma das duas gosta de falar do que é mais dela, não é falta de confiança. É apenas como os papéis e as coisas que não aguenta mesmo que mexam.
Nenhuma das duas é dada a ficar triste. A primeira acha que vai correr bem, para onde for vai correr bem. A segunda ralha “vales mais que isso” e cerra os dentes. Ficam tristes, às vezes, mas distraem-se com facilidade. A primeira é muito raro chorar, a segunda chora de fúria. Sem grande razão, depois passa.
Nenhuma das duas gosta de indecisão. Mas a primeira deixa o assunto em modo enevoado, numa espécie de background durante uns dias, e depois encontra um momento de calma e decide (aquilo que normalmente já sentia desde o início). A segunda é impulsiva. Ainda assim as decisões não variam muito, só varia a confusão que faz à volta.

A primeira gémea tem tido mais vontade de estudar do que a segunda!
(ui, tendência para a asneira!)

[Pictures of you - The Cure: reapareceu quando menos esperava e soube mesmo bem]

25 setembro 2007

REvisitado II

HÁ UM ANO, foi assim...



MEGACITIES, um documentário arrojado de Michael Glawogger que observa à lupa o submundo de Bombaim, México, Moscovo e Nova Iorque, quatro exemplos de metrópoles excessivamente povoadas, monstros simultaneamente sedutores e repelentes. Em doze capítulos e onze testemunhos, o realizador esboça um retrato destas populações, e da sua luta diária pela sobrevivência. Mas têm também em comum a resistência e a esperança, a coragem e a dignidade. Porque se este é um documento sobre trabalho, miséria, violência, amor e sexo, é-o também sobre a beleza das pessoas.
(na página indie lisboa)


E foi um murro no estômago. Bem forte. Bem duro.
O realizador apresentava as imagens e as pessoas. Seguíamos as suas vidas. E dá náuseas ver como se vive. E ficamos a sentir-nos estúpidos nas nossas queixas, porque se fosse eu a viver assim desistia. E eles atiram-se para a vida "como jactos para fora da terra".
Foi um murro no estômago. E eu achei importante saber.



HOJE FOI ASSIM...

“Um documentário musical experimental”. É assim que Timo Novotny descreve LIFE IN LOOPS. Partindo de “Megacities”, de Michael Glawogger e recorrendo aos brutos que este realizador não utilizou no filme, Novotny editou tudo e juntou-lhe ainda novas imagens de Tóquio. Se isto por si só não bastasse, acrescente-se ainda a música dos Sofa Surfers que completa esta estrondosa viagem à volta do mundo. Novotny consegue transformar o sangrento trabalho do talhante numa espécie de coreografia de música clássica. LIFE IN LOOPS é, ao mesmo tempo, fascinante e uma exigente experiência sensorial. (na página indie lisboa)

E foi um murro no estômago. Mas com a música, ritmada na repetição dos gestos. Impressionante como combina os movimentos das pessoas e das cidades com a música, como se tivessem filmado, de facto, com ela por fundo.
E foi um murro. E eu achei importante saber.


Quem me dera saber filmar como Michael Glawogger.
Quem me dera saber montar como Timo Novotny.

REvisitado I

Há dois anos...

Passeávamos por Zagreb sem lhe achar muita graça.
Eu gostei da sensação de não estar a perder nada por estar horas na esplanada, com um óptimo café.
Mas do mercado gostei muito. Gastei mais de metade do rolo de fotografia naquele espectáculo de cores e arrumação (quem entende disse diria que os cheiros eram mais que muitos e quase sempre agradáveis, eu não sei mas acredito e tento imaginar).

Hoje...
PLAC
realização: Ana Husman
Grande Prémio de Curta Metragem
no TAGV


PLAC mostra-nos os diferentes ritmos de um mercado local croata onde as pessoas vão comprar os seus produtos.
(na página indie lisboa)

E era o mesmo mercado. E voltei a passear por ali. A imaginar os cheiros.

23 setembro 2007

um dom Marcel

















Um dom Marcel.
Um dom Marcel Marceau.
Gostava de me sentar a uma mesa contigo.
Descobrir o teu jeito de acreditar na humanidade.
Gostava de aprender o que disseste no teu silêncio.
Ficar esquecida de tudo a ver.
Há provas de que se pode conhecer o pior (conhecê-lo de facto) e não azedar, mas também não alinhar.
Há provas de que se pode transformar com ternura.

Marcel Marceau
22 de Março, 1923 - 23 de Setembro, 2007

Demorei muitos anos a gostar de palhaços. Os que conhecia assustavam-me. Faltava-lhes poesia. Faltava-lhes o que me dizer.


fotografia de Erling Mandelmann

21 setembro 2007

Irresistível vontade de mudança




Isto não é um lamento.
Isto não é um descontentamento.
Não nego que este tempo de “apenas estudo”, ainda sem data oficial de acabar, me deixa esse tempo de pensar no “a seguir”.

IRRESISTÍVEL VONTADE DE MUDANÇA.

Mas não que aqui não esteja bem. Estou.
Mas não que eu queira a ruptura pela ruptura.
Não há nada de que me queira afastar.
Só quero um pouco de desarrumação.

IRRESISTÍVEL VONTADE DE MUDANÇA.

Uma casa que não seja tão minha. Um ano é pouco para se fazer uma casa, mas também é muito para não se ter casa.
Pessoas que não tenham ainda palavras para dizer quem sou. Pessoas que ainda procurem essas palavras. Aquela dificuldade de que para chegarem até aqui leva tempo (custa-me sempre muito quando me dizem - ainda que normalmente só o digam quando já chegaram).
Um lugar que não percorra de cor. Que olhe para as coisas com atenção de quem nunca viu. Encontrar novos cafés para ler, novos cantos para estar com um caderno, novas paisagens para não pensar em nada (tenho um talento natural para esta parte), nova sala de cinema. O sol a aparecer de outro ângulo.
Aqui está tudo arrumado. Um ninho onde voltarei sempre.

IRRESISTÍVEL VONTADE DE MUDANÇA.

O Andrew Bird diz muito bem destas coisas nesta fotografia.
Nesta música.
E qual o meu espanto, no concerto, ao descobrir que aquele maravilhoso percussionista, de quem não consegui tirar o olhos, Martin Dosh, era o responsável por esta música. Só podia.

hold your fire
take your place around an open fire

19 setembro 2007

Bloqueio I


















Nunca gostei de balneários.
Não gosto.
Mulheres despidas. Muitos corpos.
Olham-se. Conversam. Comentam-se.
Não gosto desses comentários.
Mas também não é lugar de conversas sérias.
Acho que sou um bocado como os rapazes no urinol… olho em frente e espero, sinceramente, que as restantes façam o mesmo.

Turkish Bath by Jean Auguste Dominique Ingres, painted 1862

Bastidores



9.30 horas de sono. O corpo não habituado.
A esmagadora preguiça habitual (a rita sabia, vinha acordar-me primeiro. antes da casa inteira, na summerweek. primeiro a mim devagar, no meu beliche com vista para um enorme horizonte... depois sim, todos os outros e a cantar!)
Hoje pior.
De pijama até ao computador, recebi uma notícia muito boa. A Revista IM já tem site. No enorme e-mail ela, que eu nunca vi, dizia coisas bonitas. Coisas a que, confesso, não me consigo habituar.
Espreitem o site. Podem inscrever-se para receberem em primeira mão o aviso do lançamento. Ideias, colaboradores, o texto da directora. Um jeito que se fará descobrir com o tempo (para mim também).

www.magazineim.com

14 setembro 2007

Meu dia hoje




Dois elementos.
Mas o que parece não é.
Nem o caracol está parado nem a tarefa lhe está a ser doce.
Arriscado pôr-se a fazer o que não se sabe.
E ainda assim o bicho é o mote da minha tarefa.


Não resisti a acrescentar que esta era a música final de
Lost in translation, da Sofia Coppola. Tanto tempo depois, não esqueço.

12 setembro 2007

Macumba... ou preconceito















Cresci com a ideia de que valia a pena gastar um bom dinheiro numas boas botas.
Ainda que não fossem as mais bonitas (eu o que queria era uns sapatos pretos envernizados!). Porque elas me levariam a todo o lado. E eu percebia isso muito bem, passeava, corria, trepava a árvores. Sabia que ter os pés a doer era o suficiente para andar zangada.

E em poucas coisas mais valia a pena gastar um bom dinheiro.
As casas tornam-se casas, não se compram casas. Mudam-se os mesmos móveis muitas vezes de sítio, juntamos o nosso jeito e não importa se é grande. Receberá sempre muita gente, pouca de cada vez porque a atenção o exige.
Os carros. Menos conforto, rádios terríveis. Canta-se, conversa-se, dorme-se, enche-se de migalhas e areia. Ouve-se “abram os olhos, vejam como aqui é bonito. Abram os olhos!”.
As viagens. Podem-se fazer baratas, gastam-se os mapas e os guias de parques de campismo.
Na roupa não, estraga-se. Na comida não, cozinha-se simples e bom! Em prendas grandes, não.
Principalmente aprendi a poupar e não lamentar a falta de dinheiro (porque é coisa que encontra-se sempre forma de dizer que falta!)
E assim… ainda hoje não gosto de ir às compras. Mesmo as coisas que gosto de comprar, gosto mais de as ver de carteira vazia porque assim aprecio só e não tenho de pensar se preciso, se quero mesmo, se não há nada melhor…













E por isso… fiquei enfeitiçada (fico sempre!) a olhar para elas. Todas muitíssimo arranjadas, muito bonitas, cheias de nuanças e cuidados que eu NÃO SEI apreciar mas percebo existirem pelos comentários que se fazem.
Confirmei um preconceito meu… é que quando vejo uma rapariga de unhas muito grandes e arranjadas e sempre nuns saltos muito altos penso sempre:

É IMPOSSÍVEL QUE ELA TRABALHE MUITO!

08 setembro 2007





Sometimes I climb high above the city
To see all the lights shining there so pretty
And think of the millions of lives going on
At this present moment
And those come and gone

And it make me float free
To feel how small my life must be…

Encontrei-a. Distraí-me. Fiquei a ouvir.
Combina comigo. Agora, por enquanto.


When ever I can I go down to the sea
And wonder at how many miles there must be
And all of the people on all of it’s shores
At this present moment
And those gone before

And it makes me float free
To feel how small my life must be…

Devia haver uma forma de ouvir música debaixo de água.
(Será que já existe?)
Combinava com o sol a pôr-se do lado de lá do vidro nesta piscina destes dias. Enquanto nado semicerro os olhos e, se pensar numa música, com aquela luz-sol-rasante, consigo imaginar que é o final do dia dentro do mar.


Sometimes I’m out in the bustling street
Dazz-led by all of the faces I see
It strikes me we get lost so soon after birth
But one smile can turn-over heaven and earth

And it makes me float free…

Não estou mesmo disposta a perder leveza.
Float free.



fotografia da Babararã