29 setembro 2011

Por dentro do vidro













Quem diria que ouvir Ludovico Einaudi me faria sentir aquele arrepio. Ao olhar as árvores muito grandes naquele jardim bonito por fora do vidro, a música reconhecida, fez-me quase chorar de comoção. Contida, claro.
Lembrei muitas reuniões sentados no chão. Semana a semana. Muitas muito difíceis. Para mim.
Lembrei os amanheceres abafados em S. Tomé. Demasiado cedo. Lentamente. Um pouco receosa do dia que começava. Como seria? Como lidar com aquilo tudo... Tanto de belo como de duro.
Lembrei os fins de tarde em S. Tomé. Cansada. Momento de parar (nem sempre desejado, mas regra).
Fiquei comovida. Com vontade de agradecer muito a sorte que tenho tido. Com tudo.
A ver se páro mais vezes assim.

07 setembro 2011

Parecida



Acho que estou a ficar parecida contigo.
Estranho-te sempre quando te chateias com a caridade, com as campanhas de angariação de fundos. Parece-me sempre estranho que alguém seja contra isso. Apetece dizer-te: achas mal que as pessoas se organizem para fazer bem aos outros? Isso é bom!! É bom que alguém faça pelos outros em vez de fazer só por si.
Mas aquieto-me e já me explicaste que não aceitas que essas coisas se tenham de assegurar assim, que são ajudas pontuais que não resolvem nada estrutural. Defendes o direito ao trabalho, ao salário, à dignidade. Que é por isso que as pessoas deviam lutar. Por igualdade e justiça… E não o consolo de ajudar e depois votar alegremente em quem cria os mecanismos que provocam essa pobreza, essa humilhação.

Hoje parei para pensar no porquê de me chatear uma certa pressão para que me ocupe, pessoalmente, dos problemas de saúde da família. Porque fujo disso, de acompanhar às consultas, às urgências (pouco urgentes)… de dar a minha inteira opinião.
Desconforto.
Comodismo? Não digo que não. Sinto que preciso de lugar na minha vida para a não-doença, o não-trabalho.
É isso. Mas não só.
Parei para perceber.
Chateia-me a falta de confiança no médico que nos vê. Essa não confessa vontade ou convicção de que falhará. Os sorrisinhos de ironia disfarçados. Quando estou a trabalhar não gosto de sentir a pressão dos familiares ou amigos médicos (há aqueles que perguntam e acompanham sem pressionar, confiando. Mas a maior parte vem acrescentar o seu peso… para que não falhem os exames que acham que devem ser feitos, os diagnósticos, os tratamentos). Sussurra-se “é familiar de um colega…”
Chateia-me. Aquele doente não é diferente dos outros, não merece nada mais, nem nada menos, do que qualquer outro! E ao fazermos (os colegas) isso uns com os outros só aumentamos a desconfiança de quem não tem esse apoio.
E eu não gosto de contribuir para essa suspeita. Escolho, também eu, confiar (ainda que não presente, atenta) aqueles de quem gosto aos colegas… que acredito, estarão a dar o seu melhor.
Devíamos lutar por um acesso à saúde para todos, com qualidade, com exigência… sem privilégios nem favores!

Estarei a ficar parecida contigo?


fotografia nossa Grécia 2011